Os efeitos do álcool são fáceis de descrever mas perceber a forma como este actua no cérebro tem sido uma enorme dor-de-cabeça até para os cientistas. Um novo estudo acaba de dar um importante contributo ao descobrir que este domina o mecanismo de activação e estabilização dos canais iónicos no cérebro. Uma descoberta que ajudará ao tratamento do alcoolismo.
Quase todos conhecemos os efeitos das bebidas alcoólicas: da euforia inicial, passando pela perda das capacidades, como a memória, até à ressaca do dia seguinte. Mais complicado, até para os cientistas, é explicar como o álcool influencia a actividade cerebral. Agora, investigadores norte-americanos descobriram a área no cérebro onde o álcool actua.
A investigação pode levar ao desenvolvimento de novos tratamentos para o alcoolismo, mas também para a dependência de drogas e para a epilepsia.
O estudo dos investigadores do Instituto Salk de Ciências Biológicas, na Califórnia, tentou compreender como é que o álcool altera o funcionamento das células cerebrais. "Uma das várias hipóteses apresentadas defende que o álcool interage directamente com proteínas de canais iónicos, mas não havia estudos que identificassem o local onde essa associação acontece", explica Paul Slesinger, que coordenou a investigação. Este trabalho mostra que as moléculas de álcool interagem directamente com uma área específica localizada dentro de um canal iónico - "pequenas bolsas" encontradas numa estrutura tridimensional, de alta-resolução, de um canal de potássio.
Este canal, por sua vez, desempenha um papel central em funções cerebrais associadas às dependências de substâncias e a episódios convulsivos. Aliás, a equipa de Slesinger já tinha dedicado algum tempo a estudar as funções destas estruturas, chamadas GIRK - são canais que abrem quando existe comunicação química entre os neurónios, enfraquecendo os sinais. "Quando os GIRK abrem, os neurónios libertam iões de potássio, enfraquecendo a actividade neuronal", explica Prafulla Aryal, outro dos autores do estudo publicado na edição online da revista Nature Neuroscience. Isso pode explicar porque perdemos capacidades e ficamos mais lentos quando bebemos.
Para perceber melhor como é que o álcool funciona, a equipa tentou determinar se as "pequenas bolsas" eram, de facto, os locais onde o álcool interagia com as GIRK. Em primeiro lugar, concluíram que existem semelhanças entre estas bolsas e as encontradas em outras proteínas ligadas ao álcool. Além disso, quando começaram a introduzir amino-ácidos que bloqueiam o acesso a estas bolsas, as moléculas de álcool já não conseguiam activar os GIRP.
Os cientistas perceberam também que estas bolsas funcionam como um gatilho que activa os canais. "Acreditamos que o álcool domina o mecanismo de activação dos GIRK e estabiliza a abertura dos canais", diz Aryal. Talvez o álcool funcione como um lubrificante para "esses mecanismo de activação", acrescenta Slesinger.
Perceber como acontece esta interacção pode levar ao desenvolvimento de estratégias para tratar várias doenças, nomeadamente apostando no desenvolvimento de um medicamento que anule os impactos do álcool no cérebro.
Além disso, se se conseguir encontrar um medicamento para activar os canais GIRK, "isso iria diminuir a actividade neuronal e a excitação e talvez fornecer uma nova ferramenta para tratar a epilepsia", explica Slesinger, já que a doença se caracteriza por períodos de actividade cerebral intensa, que causam convulsões.
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